Leilões do Ministério da Agricultura não conseguem garantir o preço mínimo, mas especialistas alertam que, sem intervenção do governo, a cotação do trigo estaria na lona. Mapa realiza novo leilão nesta quarta-feira (25)
A euforia da excelente safra de trigo colhida no Sul do Brasil em 2016 não durou nem o caminho entre a lavoura e os armazéns. Segundo a última estimativa da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a produção chegou a 6,7 milhões de toneladas, 22% a mais do que no ciclo anterior.
Mesmo com a intervenção do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) por meio de três leilões entre dezembro de 2016 e janeiro de 2017, os preços do grão não param de cair. Se durante a colheita a cotação chegou a animar, beirando os R$ 38/saca (preço mínimo), no Paraná, agora a cotação não passa dos R$ 33/saca. No Rio Grande do Sul, hoje, a saca vale R$ 28. E a situação não dá sinais de que vai melhorar.
Dois motivos principais explicam a dificuldade para o preço do trigo se sustentar. O primeiro deles é a safra espetacular da Argentina, que saiu de 10,8 milhões de toneladas, em 2015, para 15 milhões de toneladas em 2016, segundo o Ministério da Agricultura do país. O excesso do produto no mercado pressiona a cotação para baixo. Além disso, há um segundo motivo que é o câmbio do real frente ao dólar, que também está bem mais baixo do que nos picos do ano passado. Tudo isso favorece as importações e deixa o trigo nacional ainda menos competitivo.
O técnico de operações da Conab no Paraná, Eugênio Stefanelo, sinaliza que os leilões promovidos pelo governo devem continuar. “Mas eu não tenho dúvida que para os próximos leilões esse quadro de não reação do preço continua. O que ocorre é que os leilões estão dando uma certa sustentabilidade, apesar de a cotação atual não cobrir o custo operacional de produção”, explica. “O que lamentamos é que houve aumento na área do trigo e quando o aumento da produção chegou ao mercado, com boa qualidade, o preço despencou”, completa.
Stefanelo acredita que só haverá uma mudança nesse cenário com uma estabilidade construída por meio da organização do setor. “Conseguiríamos isso se tivéssemos uma melhor integração na cadeia produtiva do trigo, com uma parceria entre moinho e produtor. Precisamos de um sistema de contrato em que a gente saia dessa gangorra de uma época de maior produção e preço baixo seguido por época de produção baixa e preço alto”, sugere.
Especialista critica o preço mínimo
O analista da Consultoria Trigo & Farinhas Luiz Carlos Pacheco concorda com o fato de que uma melhor organização poderia melhor a situação do setor como um todo. Mas ele é um crítico da política de intervenção do governo. “O preço mínimo tinha que acabar. Foi uma grande ilusão, ficaram olhando o preço mínimo em vez de fazer contas e deixaram de aproveitar uma grande oportunidade”, critica. “O lucro do trigo não vem do preço, mas da produtividade. Ninguém no Brasil colheu mal. Quem colheu menos, colheu 56 sacas por hectare [bem acima da média]. Nos Campos Gerais e Centro-Sul a produtividade foi entre 70 e 90 sacas por hectare. E esse preço de R$ 33 [no Paraná] é o que está agora, mas na hora da colheita, em outubro, estava na faixa de R$ 37”, opina.
Pacheco, no entanto, reconhece que os leilões evitaram uma queda maior, mas acrescenta que há um efeito colateral nessa iniciativa. “Todo mundo ficou esperando que o governo fizesse intervenção. E, no fim, em nenhum dos leilões se pagou o preço mínimo”, diz. “Sem contar que o governo também não está escoando devidamente. Seria preciso uma remoção muito maior de trigo dos estoques do Rio Grande do Sul, por exemplo, para remanejar para outras áreas”, completa.
Fonte: Gazeta do Povo